Carta de DespedidaA Chapter by Rafael Castellar das NevesEntendo que neste momento há muito o quê se perguntar, mas digo que não há muito a se dizer. Antes de qualquer coisa, não pretendo, aqui, justificar os fins, mas quem sabe explicar um pouco dos meios. Sei que nunca fui, e nem quis ser, exemplo de coisa alguma " talvez possa ter sido daquilo a não ser ou se fazer. Mas as coisas tomaram proporções terríveis para mim. Não tenho conseguido suportar. Meus dias se tornaram cinzentos, iluminados apenas por uma penumbra que, para falar a verdade, nunca entendi de onde vinha. Tornei-me amargo. Meus machucados devem ter se transformado em calos, pois fiquei duro, cascudo, arredio. Passei a me esquivar das cosias que poderiam, mesmo remotamente, incitar meus sentimentos. Não tinha mais controle sobre eles, então tentei mantê-los quietinhos, lá dentro, lá no fundo. E a ausência destes sentimentos me deixou seco e, confesso, até mal educado. Tornei-me algo insuportável, negativo, sempre se lamentando entre meus amigos. Aliás, afastei quase todos de mim, os que restaram foram aqueles que tinham uma incrível capacidade de me suportar, alimentando uma quase eterna paciência, e lhes agradeço por isso. Enfim, passei a ser a maçã podre do cesto e tive que sair. Não seria justo que os meus problemas tão bem nutridos por minha insatisfação, que meu pessimismo tão bem disseminado, que minha aspereza que tanto fiz questão de esfregar na cara de quem me estendeu as mãos, afetem as vidas daqueles que tanto me querem bem. Cansei de lutar e não chegar a lugar algum. Cansei de tentar e pagar preços por aquilo que nunca consegui ter e quando tive não fui capaz de manter, lamentável. Como disse Camus: Somos responsáveis por aquilo que fazemos, o que não fazemos e o que impedimos de fazer. E diante desta máxima, entendo que, na verdade, tive apenas um único problema: eu! E como meu responsável, usei meus poderes para resolver minha situação. Apesar de egoísta foi o modo mais eficiente que encontrei. Aos meus amigos: meus profundos agradecimentos por fazerem parte da minha vida, por sempre me apoiarem, por sempre me emprestarem os ombros e por me proporcionarem os melhores momentos da minha vida. Aos meus colegas: meus sinceros votos de sucesso, que vocês se tornem cada vez mais especiais e brilhantes em seus caminhos. Aos meus amores: minhas saudades, meus carinhos, meus desejos, meus mais profundos e verdadeiros sentimentos, minhas desculpas por não ter sido aquilo que lhes prometi, não ter seguido nossos planos e ter partido sem mais nem menos, sem nunca olhar para trás Ao meu amor: o maior amor que senti em toda a minha vida, os meus melhores momentos, meus melhores carinhos, meus mais profundos desejos, minha vida. Saiba que lhe amei como nunca amei ninguém, lhe desejei como nunca desejei alguém, nunca tive com ninguém o que tive com você. Você foi a melhor coisa que aconteceu em toda minha vida! Nunca esquecerei seu cheiro! Me desculpe por não ter aguentado lhe esperar. Aos meus irmãos: minhas mais dolorosas desculpas, por partir, por ser intolerante e causar tantas brigas, tantos arranhões, tantas injustiças. Sei que haverá sempre um vazio entre vocês, mas talvez seja melhor que um preenchimento amargo. Meus discos, meus livros, tudo, fiquem à vontade. São para vocês, sem brigas, hein?! Aos meus pais: obrigado pela oportunidade e por tudo aquilo que o amor de vocês me proporcionou. Mas me desculpem, não fui sábio o suficiente para mantê-la, fui fraco e covarde. Perdão pelas decepções, pelas notas baixas, pelas brigas com meus irmãos, pelas travessuras, pela ausência e agora, por partir. Ah, mãe: na verdade, fui eu quem colocou aquele sapo na sua gaveta de calcinhas e não minha irmã, como eu havia dito.
A todos: todo o meu amor (sim, é verdadeiro e enorme, mas minha dor é maior), todos os meus mais sinceros sentimentos e minhas eternas desculpas, mas não dá mais! Quando se lembrarem de mim, imaginem que fui viajar para um lugar distante, não em busca da minha felicidade, já que sempre justifiquei todos meus atos com essa infinita busca frustrada, mas em busca do meu lugar, do meu sossego, da minha paz. Levo comigo meus sonhos, minhas idealizações, meus objetivos de vida, minhas supostas razões para ser feliz. Não os compartilho, porque foram os meus maiores erros: sonhei demais e meus sonhos se tornaram suficientemente enormes dentro de mim que transbordaram e inundaram minha realidade, afogando todos os meus sentimentos, afinal eram sonhos e sonhos que não consegui realizar, nem chegar perto, por minha tão grande culpa! Seja lá para onde eu esteja indo, levarei um pouco de cada um de vocês comigo, senão tudo. Sei que desculpas não são suficientes, mas é o que me restou: desculpem-me! Saibam que estarei melhor assim!
Adeus!
P.S.: espero que a toalha molhada no pescoço tenha ajudado, não queria estragar também o funeral.
São Paulo, 22 de março de 2009. © 2015 Rafael Castellar das Neves |
Stats
59 Views
Added on November 26, 2015 Last Updated on November 26, 2015 AuthorRafael Castellar das NevesSao Paulo, Sudeste, BrazilAboutNascido em Santa Gertrudes, interior de São Paulo, formado em Engenharia de Computação e um entusiasta pela literatura, buscando nela formas de expressão, por meio de cr&oc.. more..Writing
|